quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

tragédia

Parte 1

Tenho medo de morrer buscando algo que estava aqui o tempo todo
Passar a vida correndo atrás das coisas e correndo para fugir das outras
Que tragédia, olhar as folhas, sentir a brisa fresca, os respingos da chuva de verão, o abraço do amado
Que tragédia passar por tudo isso com medo, ânsia, angústia, dor enraizada no peito.
Reclamo do que não tenho, e muito 
Mas reclamo ainda mais do que tenho e que mesmo assim não consigo tocar, compreender, sentir

Uma tragédia
Não ter medo de nunca melhorar, não
A tragédia é não saber se há capacidade em mim de ser feliz, de olhar as pequenas coisas
Sofro, mas queria sofrer menos
Choro, mas ainda tenho braços e pernas, piso firme
Grito, mas poucos ouvem minha voz abafada
Caio, me arrasto e caio de novo, mas tenho esperança
Por isso espero, mesmo que pouco e à contra gosto, espero

Parte 2

Então vou esperar sem sentar quieto
Vou correr, buscar ar novamente, tocar os tecidos
Sentir os cheiros, amar e ser amado
Apesar das dores, dos abandonos, das mágoas

Vou viver, de alguma forma, vou continuar
Até o dia em que meu corpo ser pó e virar um com o mundo 
Até esse dia eu vou fazer o que posso 
Correr na minha velocidade, andar no meu ritmo
Até lá, vou indo
Uma respiração de cada vez, uma página de cada vez
Agradeço ao calendário 
Nada como um dia após o outro

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Mais je ne la veux pas.

Ils ont volé ma joie de vivre

Est-il, l'ennemi, public ou privé?

Si public, est-il le monde en guerre contre moi,
qui perece, sans armes? 
Ou, est-ce qu'elle me manque la capacité de bien  voir le monde et de ne plus me blesser

Si privé, je me'en prie, donnez-le moi
Ça déjà existait, je sais, je me souviens,
c'est pas une mensonge

C'est vrai! J'ai déjà été heureux!

Et je prie, je crie, je lamente 

Vivre

Malgré tout, vivre

domingo, 9 de outubro de 2022

Lugares e Pessoas

 Como meus antigos dessas terras, o espelho me deixa atônito
Também como eles, daqui às ilhas do Caribe, tive algo roubado 
O lugar, as Pessoas, todos que estavam ali. 
Possuídos, condicionados, cortados.

As ruas dos lugares que vivi trazem um pouco daquilo que não se tem mais
nas memórias enfurnadas entre os comércios, ruas, casas, praças e rostos conhecidos.
Mas metade das portas foram fechadas e o vento já não leva uma brisa tão fresca pelas ruas como antes. 
E pior, até mesmo minha antiga casa virou parte da realidade bruta, que espanca a memória.

Lugares continuam a existir sem que estejamos lá, o mundo de fato, gira. 
Mas quando voltamos, porque já não vemos mais nada? Não sentimos mais nada
Não há com quem falar, não há teto onde dormir, há apenas um lugar
Que existiu mas hoje faz algum papel que não me incomodo em explorar

As Pessoas não continuam
Como colonizados, levados embora, um à um 
Ou eu, ou eles, não fujo da fila nem tento interromper a roda, que gire
Às vezes, até mesmo, por vontade própria,
com despedidas esganadas pelos dentes que saem pelos lábios quase como um suspiro

Os lugares e as Pessoas vão
E não saber pertencer pode até não ser tão ruim quanto não saber sobreviver
à todas as mudanças e navios piratas que nos levam de tempestade em tempestade
E passamos os dias nos perguntando até quando esse casco irá suportar o tranco das marés

terça-feira, 23 de agosto de 2022

"Manipulador, fez sua decisão e que vá com Deus!"

"Estrela do meu céu", me chamou em embriaguez
Acreditei que era, mas o céu logo escureceu 
e estrelas não couberam mais

"Filho" era como me chamava nos finais de semana intercalados
enquanto o processo judicial era feito para me privar auxílio
o emocional era de distância, desde o início

Por duas letras do meu nome é como elas me chamavam
a primeira, falando alto, não gritando, dizia que me amava
A segunda, quando não gritava, fazia o mesmo

Como torres gêmeas, a primeira explodiu, aos destroços
olhei para cima e torci para ser esmagado, levado junto
E então vi minha morada, a outra metade, ainda de pé

Tremendo, quase um arranha céu pêndulo
Corri e chamei de moradia. Ferido e instável
Me propus a ser cimento, tijolo, ferramenta

Mas quando as portas abriram, não havia mais prédio
Não havia cor, nem cheiro nem calor
Só um terreno baldio ao lado dos recentes destroços

Sempre imaginei os natais e em como eu seria chamado
Mas cada vez foram chamando menos
Os natais continuam 
E meu nome, ou apelido, por poucos, ainda mantido

quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Tempo

Se me dessem um dia no futuro
não gostaria, e meu corpo empolaria em feridas
que abririam em sangue
A matéria desse corpo é do presente

Se me dessem um dia no passado
não gostaria, e meus sentidos falhariam
Língua áspera, olhos secos, nariz dormente e digitais rasgadas
A matéria desse corpo é do presente

E não digo que sou bobo 
que perderia os números de loteria
ou que não aproveitaria melhor das despedidas
que quando se deram nem nome tinham 

Apenas aceito, com a prepotência de cogitar
hipóteses possíveis ou iludidas 
porque se tudo me diz que é aqui onde devo estar
tiro a responsabilidade dos meus ombros e entrego ao tempo

E se tudo me diz que aqui devo permanecer 
Até que aqui torne-se lá
Já não sou obrigado e nem responsável
Deixo o universo, o fluxo das águas
a direção dos ventos e do tempo decidirem

domingo, 7 de fevereiro de 2021

A situação do meu peito em Fevereiro

O turbilhão subiu das pernas para o peito
Deixou minhas panturrilhas com um vazio dolorido
Mas a latência involuntária não é mais como mil agulhas
Agora é pano quente que cobre meu tronco, pesado e úmido
 
Queria, num banho de rio, sentir tudo afora pela água 
E os restos, que a correnteza levasse
Mas água não cura solidão
E solidão velha e impregnada que nem essa não lava fácil 

Antes as barras dessa prisão fossem concretas
E os guardas, que decidem tão facilmente meu ir e vir, fossem cruéis 
E o colchão justificasse minha insônia
E as paredes infiltradas dessem nome à minha doença

Mas aqui amor é disfarçado de culpa
Cobrança é vendida como segurança à preço de dólar
Estar sozinho, pelo visto, foi minha escolha
Da cabeça aos pés, turbilhão 

E em algum lugar uma criança vai à rua
Me vê 2 reais de pão e uma coca
E seus sentidos anseiam, no máximo, pelo dia seguinte
E seu corpo, da cabeça aos pés, simplesmente é

domingo, 8 de novembro de 2020

Meu cemitério de navio

 

Há alguns dias abandonei navio

Pulei em água fria, minhas juntas petrificaram-se em gelo

Achei que estava fugindo dos problemas

Que a tripulação era o que eu ia deixar pra trás

Mas na água me rondavam as almas dos meus mortos

Olhavam pra mim com os mesmos olhos de quando morreram

O medo da escuridão abaixo d'água e a companhia fúnebre

Só me senti mais sozinho, mais frio, mais derrotado

Meu corpo foi até o fundo, onde pensei que fugiria

Matei tudo, matei todos, morri comigo mesmo

Acenderia um cigarro nas profundezas do meu medo?

É apenas o que faço, espero as almas se assentarem

Mas sempre correm a minha volta com medo e agitadas

Há alguns dias abandonei navio

E enterrei ele comigo mesmo

Em meio ao oceano

Cavei minha cova e morri com meus medos

Porque tive medo de enfrenta-los

Então os afoguei, junto do meu corpo

Onde todos morremos de olhos fechados