quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Tempo

Se me dessem um dia no futuro
não gostaria, e meu corpo empolaria em feridas
que abririam em sangue
A matéria desse corpo é do presente

Se me dessem um dia no passado
não gostaria, e meus sentidos falhariam
Língua áspera, olhos secos, nariz dormente e digitais rasgadas
A matéria desse corpo é do presente

E não digo que sou bobo 
que perderia os números de loteria
ou que não aproveitaria melhor das despedidas
que quando se deram nem nome tinham 

Apenas aceito, com a prepotência de cogitar
hipóteses possíveis ou iludidas 
porque se tudo me diz que é aqui onde devo estar
tiro a responsabilidade dos meus ombros e entrego ao tempo

E se tudo me diz que aqui devo permanecer 
Até que aqui torne-se lá
Já não sou obrigado e nem responsável
Deixo o universo, o fluxo das águas
a direção dos ventos e do tempo decidirem

domingo, 7 de fevereiro de 2021

A situação do meu peito em Fevereiro

O turbilhão subiu das pernas para o peito
Deixou minhas panturrilhas com um vazio dolorido
Mas a latência involuntária não é mais como mil agulhas
Agora é pano quente que cobre meu tronco, pesado e úmido
 
Queria, num banho de rio, sentir tudo afora pela água 
E os restos, que a correnteza levasse
Mas água não cura solidão
E solidão velha e impregnada que nem essa não lava fácil 

Antes as barras dessa prisão fossem concretas
E os guardas, que decidem tão facilmente meu ir e vir, fossem cruéis 
E o colchão justificasse minha insônia
E as paredes infiltradas dessem nome à minha doença

Mas aqui amor é disfarçado de culpa
Cobrança é vendida como segurança à preço de dólar
Estar sozinho, pelo visto, foi minha escolha
Da cabeça aos pés, turbilhão 

E em algum lugar uma criança vai à rua
Me vê 2 reais de pão e uma coca
E seus sentidos anseiam, no máximo, pelo dia seguinte
E seu corpo, da cabeça aos pés, simplesmente é