quarta-feira, 9 de maio de 2018

Mãe

Eu não sei onde tudo começou  a ficar tão difícil.
Talvez tenha sido quando eu comecei a me sentir excepcionalmente triste, ou quando eu descobri que o meu prazer era despertado nas pessoas "erradas", ou quando descobri que sentia demais das piores maneiras possíveis. É nesse palpite de sentir muito que eu aposto boa parte dos meus problemas, incluída aquela depressão que vai e volta como um vizinho chato que insiste em entrar na minha casa sem permissão.

Os dias não têm sido fáceis, nem pra mim e nem pra você. Nós temos nos tratado de maneiras que nunca mereceríamos e imagino que há muita culpa nas circunstâncias, na divergência de pensamentos e na insistência inconveniente que é viver com alguém de momentos tão diferentes dos seus.
Sinto por mim e consigo facilmente sentir por você e saber que somos ambos solitários. Sentimos falta de carinho e de amor grande parte do tempo. Sentimos falta de gente que foi embora e de gente que nem mesmo chegou a aparecer nas nossas vidas. Temos amor pra dar, mas ao mesmo tempo nos envolvemos em carapaças rígidas e impenetráveis porque já passamos por muito e temos medo de passar de novo. A vida não foi e nem tem sido fácil com a gente e é triste saber que passamos boa parte do tempo nos colocando um contra o outro, quando o que mais precisamos é estar juntos.

Eu não acredito que laços familiares sejam premissas de boas relações afetivas. Quando se nasce gay, é mais fácil de ver que nossa verdadeira família não somos nós que escolhemos é mais fácil ainda de ver que nossa família muitas vezes não vai ser 1/3 do que achamos fora de casa. Hoje descobrimos que família pode te fazer sofrer, pode te fazer chorar e inclusive pode, no sentido literal da palavra, matar você. E eu sei que sou privilegiado. Da minha família, você e Vanessa, sempre tive abrigo, amor e carinho. E mesmo que por algum tempo tenham havido pausas para reflexão e aquele tipo de crescimento gradual e efetivo, eu sei que também tive de vocês aceitação e entendimento. Eu sou grato por esse amor e me culpo todos os dias por não expressar de volta todo o amor e a gratidão que foram cultivados dentro de mim. Todas as vezes que ouço histórias de famílias que machucam seus filhos, lembro de como sou sortudo de ter você.

Eu demorei muito pra começar a entender o que é amor próprio. Demorei tanto tempo que consegui cicatrizes emocionais e físicas das dores que passei e que insistem em me lembrar sempre de como é sofrer. Hoje eu consigo ver um feixe de luz do que é amar a si mesmo. Consigo não abraçar todo ele de uma vez, algo que com certeza é impossível pra qualquer um, mas pelo menos entender que ele existe e está lá, para mim, pronto pra ser usado. Hoje eu me amo. E por incrível que pareça, mesmocom todas as nossas diferenças, tenho certeza de que você é no mínimo 50% de mim, algo que ninguém mais conseguiu ser. Te copiei nos melhores traços e cresci nas suas melhores lições. Me desculpa por não conseguir retribuir todo o amor que você me deu todos esses anos, é uma tarefa impossível de se completar integralmente e difícil de encaixar na nossa cansada rotina. Mas saiba que quando você duvida do meu amor, dói tanto quanto eu duvidar do seu amor, é ofensivo. Eu te amo e eu sei que esse amor nunca vai ser o suficiente pra você porque você merece muito mais, mas faço o que consigo e amo como posso. Vai dar tudo certo no final das contas, sempre dá, é o que costumo a dizer para mim mesmo...

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