O mesmo me assusta.
As mesmas cores; as mesmas formas; os mesmos, eles me assustam.
Impermanência é minha palavra favorita, e meu hábito favorito é mudar, experimentar, criar. Não só tenho aversão à correntes mas as vejo com mais frequência que o comum. Nos meus estudos, trabalho, nas pessoas, nos meus sentimentos e nos meus trejeitos. No meu eu. Vejo correntes até onde o sol se põe.
As vezes sinto que o meu eu escritor se afasta de mim. A indisposição para a escrita me atinge como um velho aposentado, que diz adeus aos seus enquanto lamenta. As letras me cumprimentam com um aperto de mão amistoso e não muito além disso acontece antes delas desaparecerem ao vento novamente. Sou como um especialista velho que tem a técnica enraizada nos hábitos mecânicos das mãos mas com os sentidos cansados e indecisos, questionadores se este é ou não o caminho certo.
É nesse texto corrido de vários pontos que tento expor. Me expor verdadeiramente, como um poeta que não é fingidor e cuja dor se sente. Mas como faze-lo? O maior desafio daqui não é nem mesmo saber mostrar, organizar as palavras, ter coerência ou vocábulo, quem me dera se fosse.
O desafio é me decifrar. Ir por entre as entranhas do meu ser e descobrir-me. Tento me conhecer há algum tempo guardado em anos. Sou ansioso e me procuro com constância. Equipado de um lampião antigo e marcado por histórias, pelejo por entre árvores altas de um bosque escuro. Posso estar à espreita, escondido atrás de algum desses troncos velhos, a espera de socorro. Ou posso muito bem estar inerte dentro de um lago profundo, cercado de jacarés mortíferos. Não sei onde estou, mas procuro. Procuro-me enquanto cansado e frequentemente desestimulado. Vivo uma constante caçada e só por esta denominação, "caçada", gostaria de que as coisas fossem tão simples quanto o nome.
O que temos até aqui? Um escritor que já não é um escritor, alguém que não é o que foi e tem medo de continuar sendo o mesmo, um homem que se procura com uma cegueira crônica que, à qualquer momento, trará um fim inesperado à caça.
E consigo? Apesar da técnica, da procura, da angústia, consigo me expor? Consigo me transpor em palavras? Vou tentar ser conciso. Objetivo.
Sou alguém sozinho. E me dói saber disso. Não é necessariamente o peso da solidão, nem o medo de ser o único. A dor está em não saber. Em não entender essa solidão arbitrária e consequentemente, não saber se ela me devora. Porque se tem algo de que estou certo, é de estar sendo devorado vivo. Sinto os dentes afundarem na minha pele e sinto o tecido romper. Porra, sinto até mesmo o sangue sair de mim. Perco vitalidade e enquanto me procuro, me descubro presa. Talvez já tenha me achado e, como já disse, sou caça e caçador. Se já me achei, por que me devoro?
O que faço com a solidão? Me disseram que não estou sozinho. Me disseram que está tudo bem em querer outros, em querer ajuda de outros. Mas pra que? Dos outros eu ganho rejeição e daqueles que nem isso me dão, ganho a conformidade de não tê-los. Me sinto sozinho perto daqueles que me têm como alguém. Me tenho só e somente numa roda de amigos, de família, de conhecidos. É difícil querer alguém quando tal opção nunca me deu nada além do desejo. E é assim que sou, um sonhador e alguém que quer. Estou sempre querendo e talvez essa seja me sina. Uma bênção em partes, sim, mas do que tiro em frente à tanta negação? Eu mesmo. Pois sou o resultado depois do sinal de igual. Sou o número resultante de uma equação de desejo e procura de afeto. Sou um número e quem me calcula não é bom em matemática.
Sou muitas coisas, mas da qual eu tenho certeza é esse número que me diz quem está aqui. Por mim. O escritor, caçador, presa, impermanente sonhador que está atrás de algo maior. Sou um, e só isso.
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